Estava subindo de barco pelo rio Tapajós quando um engenheiro agrônomo, especializado em agroecologia, me sinalizou uma série de árvores de grande porte no horizonte e comentou; “essas são castanheiras plantadas por civilizações indígenas, possivelmente praticada há 10.000 anos atrás. Passei o resto da viagem, remodelando as minhas cognições sobre a ecologia, entendendo que de fato, existia já dos tempos ancestrais uma prática produtiva de coexistência mutualista entre ser hum...
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Estava subindo de barco pelo rio Tapajós quando um engenheiro agrônomo, especializado em agroecologia, me sinalizou uma série de árvores de grande porte no horizonte e comentou; “essas são castanheiras plantadas por civilizações indígenas, possivelmente praticada há 10.000 anos atrás. Passei o resto da viagem, remodelando as minhas cognições sobre a ecologia, entendendo que de fato, existia já dos tempos ancestrais uma prática produtiva de coexistência mutualista entre ser humano e bioma amazônico. Finalmente a minha visão de ativismo binomial, conceito geral que já se demonstra totalmente ineficaz e obsoleto na dialética entre preservar sem interferir ou interferir sem preservar, se moldou num terceiro caminho de entender a possibilidade da atividade humana em convivência simbiótica e regenerativa com a Natureza.
Uma década depois aprendi que esse pensamento já foi amplamente desenvolvido e se chama; “Terceira Via Amazônica" o qual principal objetivo é fornecer conhecimento baseado em ciência, tecnologia, inovação e planejamento estratégico para o desenvolvimento de uma economia de floresta em pé com rios fluindo, uma bioeconomia movida pela rica biodiversidade Amazônica.
Para operar essa inovadora transformação foi idealizada a iniciativa Amazônia 4.0 pelo pesquisador Dr. Carlos Nobre do Instituto de Estudos Avançados da USP, visando agregar as potencialidades econômicas da sociobiodiversidade Amazônica às novas tecnologias e possibilidades que emergem da Quarta Revolução Industrial. Diz respeito à ampla utilização de tecnologias modernas desta revolução industrial em curso-a junção de tecnologias digitais, biotecnologias e ciências dos materiais. Tal diferencial impulsiona os “ecossistemas de inovação”, as associações planejadas de (1) conhecimento avançado, tanto científico quanto tradicional, (2) novos tipos de negócios e consumidores e (3) novas formas de produção e equipamentos inteligentes, trazidos pela Quarta Revolução Industrial.
Porém foi somente no ano de 2020, quando assisti uma apresentação online do Dr. Carlos Nobre, que entendi como poderíamos ajudar. Sob o paradigma da Terceira Via Amazônica estava se falando na live de um projeto concreto, altamente tecnológico e integrado com processo formativos e produtivos com as comunidades e os povos da floresta amazônica chamados os “Laboratório Criativo da Amazônia (LCA)”. Estruturas portáteis e itinerantes que viajarão pela Amazônia promovendo a capacitação de populações no uso de novas tecnologias em cadeias produtivas existentes e principalmente para geração de novos usos e produtos a partir dos ativos biológicos e biomiméticos da floresta.
No mesmo dia mandei um email para o Dr. Nobre oferecendo uma cooperação do Atelier Marko Brajovic para desenvolver a infraestrutura arquitetônica dos Laboratórios Criativos da Floresta. Pois os nossos estudos, projetos atuais na Amazônia e experiência na construção e logística no local, poderiam ser úteis na criação de um projeto inovador alinhado com as premissas e propósitos do projeto da Amazônia 4.0.
O programa da biofábrica LCA C-C (Cacau-Cupuaçu) foi apresentado pelo coordenador Dr. Ismael Nobre e seu equipe, onde a infraestrutura precisava fornecer os ambientes abrigados necessários para todo o processo de capacitação, compostos seis módulos: Casa de Fermentação, Estufa e Secagem Solar, Laboratórios de Produção (Biofábrica), Oficina de Modelagem 3D, Plenária e Centro de Comunicação e Energia. O módulo Laboratório de Produção concentra os equipamentos e tecnologias que produzem os produtos da cadeia e terá 3 ambientes fechados e conjugados; quente normal, quente aséptica e refrigerada aséptica.
Após quatro meses de pesquisa e desenvolvimento nas áreas de processo de produção, materiais, tecnologias e sistemas construtivos, logística, biomimética e arquitetura indigena, chegamos num conceito arquitetônico entendido no contexto metabólico do fluxo da energia, matéria e informação no sistema da Biosfera. Onde tudo está em tudo, as paredes viram membranas e as construções casulos temporários, veículos em metamorfose interdependentes e multi-específicos da produção regenerativa humana.
O projeto de arquitetura metabólica dos Laboratórios Criativos da Amazônica manifesta uma visão orgânica da arquitetura, a qual transcende a dialética romântica do natural/artificial. A nossa proposta expande a visão mecanicista para uma “ecologia aumentada” a qual envolve e integra o mundo biótico e abiótico, a fibra e o plástico, a tecnologia construtiva ancestral e futura.
A arquitetura composta por elementos modulares se instala com leveza sobre o solo, adaptando-se à operação logística e contexto natural/artificial. Módulos que se montam e desmontam em componentes multifuncionais e transportáveis.
A implantação da arquitetura se inspira na tipologia das aldeias indígenas, criando percursos e áreas que favorecem o fluxo da multiplicidade dos processos, produtos, energia, água, funcionários, convidados e comunidade de forma clara e visualmente permeável.
O segundo tema que inspirou o processo criativo da formação espacial dos módulos foi a organização do fruto do cacau na ordem das sementes, membranas e geometrias.
Os módulos, por sua vez, se baseiam no sistema estrutural geodésico composto de conectores de aço e um segundo sistema independente de divisão das áreas funcionais internas. Finalmente, as membranas que revestem os módulos das estruturas geodésicas são pensadas de forma multi-funcional permitindo o controle da incidência térmica do sol, ventilação natural e impermeabilidade a partir de diferentes características de camadas dos polímeros.
O metabolismo da implantação entrega o programa produtivo, formativo, energético, operacional e regenerativo.
Projeto: Atelier Marko Brajovic
Diretor de Criação: Marko Brajovic
Diretor de Projeto: Bruno Bezerra
Coordenador de Projeto: Mayra Shinzato
Arquitetos Colaboradores: Lucas Bio, Paula Thyse
Design Gráfico: Bárbara Morais
Produção: Hybrida Production
Cooperação: Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia - IMAZON
Centro de Empreendedorismo da Amazônia